08 de julho de 2023
Com a promessa de juros altos e retorno imediato, os procedimentos de corretagem e intermediações de ativos financeiros em bolsas de valores ou criptomoedas realizados de maneira irregular ganham volume no judiciário.
Utiliza-se plataforma eletrônica (site próprio do “trader”) para atrair investidores com a promessa de ganhos acima da média, através de corretagem em bolsas de valores ou na compra e venda de criptomoedas, normalmente “bitcoins”. É fornecido ao investidor resgates iniciais, levando a pessoa a realizar novos aportes, na maioria das vezes, de maior valor, ao que os próximos resgates não são realizados.
Toda essa dinâmica é realizada por um grupo de agentes que, em tese, possuem o objetivo de receber lucro ludibriando e induzindo a erro pessoas que querem entrar no mercado de investimentos. Os captadores utilizam-se de site ou grupos em redes sociais e divulgam a possibilidade de aferição de lucro alto e rápido como chamariz para possíveis investidores. Esses captadores repassam o cliente para o suposto “trader”/investidor da empresa, com quem o negocio é realizado, tudo mediante contrato de investimento.
A grande problemática desta situação é que o golpe não se dá por mero desacordo contratual ou mero erro de investimento. Veja: para que a conduta do “trader” e seus companheiros de equipe seja considerada criminosa, a intenção de enganar (dolo) precisa estar presente. Seja desde o início, seja mantendo a atividade depois de perceber que não tinham mais capacidade técnica/financeira necessária para continuar intermediando as operações de mercado.
Eis, em síntese, o esquema chamado de “pirâmide financeira”: prometer ganhos em que o pagamento dos que aderiram ao “investimento” dependem do ingresso de novos investidores. O objetivo é beneficiar quem ocupa o topo da pirâmide – idealizadores ou fundadores-, sendo cada vez mais recursos necessários para alimentar o ciclo do esquema. Normalmente, os últimos investidores são os mais prejudicados, visto que, em certo momento, torna-se inviável manter o mesmo fluxo de capital de entrada e de saída (aportes) do golpe financeiro.
Qual é o crime e quem o julga?
Em tese, configura-se o crime de estelionato (artigo 171 do Código Penal) sendo competente a Justiça Estadual para processar e julgar a conduta – exemplo: enganar vítima determinada fazendo-a acreditar que está fazendo investimento na bolsa de valores ou criptomoedas. Contudo, caso a situação se amolde nos termos do artigo 2º, inciso IX da Lei 1.521/1951 (crime contra a economia popular), o foro competente para processar e julgar a demanda será a Justiça Federal – exemplo: especulação financeira e promessa irrealizável.
Normalmente nesse cenário, os crimes de associação/organização criminosa (a depender da quantidade de pessoas “no topo” da pirâmide, artigo 288 do Código Penal/Lei 12.850/13) e lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98) também estão incutidos na investigação ou persecução criminal.
Fui vítima:
O ideal é tomar medidas assecuratórias, tanto no âmbito cível, mas especialmente no âmbito criminal. Acionar as autoridades registrando a ocorrência junto da Polícia, Ministério Público ou do Judiciário. A atuação de um advogado criminalista é imprescindível para que medidas assecuratórias sejam tomadas, seja para o acompanhamento da vítima junto da comunicação do crime seja para adotar medidas para tentar reaver o dano patrimonial sofrido.
Estou sendo investigado/acusado:
A mera realização de operações de corretagem em ativos financeiros não é crime. Da mesma maneira que o mau investimento não pode ser considerado ato criminoso, mesmo que tenha sido configurado ilícito civil. O ideal nesse cenário é procurar um bom advogado criminalista para que possa te orientar e representar com toda técnica possível e necessária que a dificuldade da temática enseja.
Para evitar essas situações é importante que se procure saber a procedência da empresa com quem se negocia, mas também procurar noções básicas de investimentos, bolsas de valores e criptomoedas, inclusive dos possíveis riscos que tais operações podem acarretar. Buscar plataformas conhecidas, de corretoras confiáveis e carteiras de criptomoedas populares também ajudam a evitar que se tenha alguma ilicitude na contratação. Quanto às criptomoedas, as carteiras seguras ("cloud wallets") ajudam a reduzir riscos.
Jéssica Nozé, advogada especialista em Processo Penal e Ciências Criminais.
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